quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Espelho, chão, sexo e dor


Agoniado, sentou-se só, no chão, em frente ao espelho, que estava apenas escorado em algumas caixas de papelão com livros, no quarto de trás do apartamento. A pouca luz, fraca, deixava pouco a ver de seu rosto, que andava inchado por aqueles dias. Sentou-se como criança, em frente de si mesmo, em frente à própria imagem.
Ali pôde perceber durante alguns dias que a dor que sentia não era plena. Surtava alto, subia as paredes, mas ali estava ele, em frente a seu corpo, seu corpo material, inteiro, um rosto que não reconhecia a si mesmo, nas suas ações e decisões. É como se o acompanhasse, em seus olhos, o olhar de outros, de outrem, de pessoas mais velhas, que passaram na sua vida e lhe marcaram de uma maneira ou outra. Via-se ainda criança, por mais que ali, em frente ao espelho, entre as pernas, se protuberasse uma série de pêlos. Era velho, tinha barba, mas carregava consigo, nos espaços que ocupava, o olhar, a avaliação, a aprovação dos outros. E, por isso, não conseguia viver sozinho, solitário. Precisava conversar, beber, sair, namorar, para esquecer que carregava tantos olhares e anseios. 



***


Se o telefone tocasse, possivelmente, seria ele. Gostaria e ao mesmo tempo não, que não fosse ele quem telefonasse. Gostaria que outras pessoas, amigos, telefonassem, e que se desacostumasse com os telefonemas dele. Telefonemas de bom dia, para falar besteira, para passar o tempo, para dar boa noite, para mandar abraço, para mandar beijo, para dizer que gosta muito, para dizer que ama, para resolver compromissos, pensar projetos, averiguar a vida do outro, com quem está e saiu, se vai ou não para casa, reclamar da vida, reclamar do outro na vida, ser grosso, brigar só para depois ligar novamente e pedir desculpas, e ligar mais vezes. E isso porque eram ex-namorados.
Ainda assim, deixou que a ansiedade o tomasse: a espera pelo seu telefonema. Outrora, havia já tomado a corajosa decisão de deletar o número do ex-parceiro do celular, para que nunca mais pudesse telefonar. Ora, meio turno depois, ia até a lista de últimas chamadas, e lá figurava o bendito número. Bastava apenas editar e salvar – novamente – na sua lista de contatos. Feito!



***


E se dissesse que ainda o amava? Enfim, já havia dito isso uma porção de vezes, ele sabia, se quisesse, já teria voltado. Mas então, o que fazer, se não fazia mais sentido repetir que o amava? Bastava considerar-se, de corpo e alma, solteiro, ir à Parada (Gay) não com receio de ver o amigo com seu novo amigo amante, mas para conhecer outras pessoas, outros homens, fazer novos amigos. “Atoro fasser amissades”, parafrasearia sua amiga russa, que viera à cidade no verão passado.