domingo, 16 de novembro de 2014

mundo aberto sorriso incerto

sim
queria mesmo dizer que são meus sonhos
essa luz e preguiça de domingo na tua cama
o cheiro do novo pelo ar
a impressão de novo começo
ou a ansiedade de 17 anos que vai saindo pela primeira vez
ou de quem perde o medo do mundo para amar e beijar os amigos em viagens distintas

posso dizer de um novo recomeçar
isso não é poesia, pode ser confissão
pode ser o que for
até expressão

mas escrevo e constituição de mim, dos outros, da tua cama e de ti
não sei mais quem sou

mundo aberto, sorriso incerto
eis-me aqui

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

10 minutos enamorado

10 minutos.
Sim, nosso namoro durou dez minutos. Não mais, nem menos.
Nem tão só, nem já, nem tarde. 10 minutos.

Ali, nos enamoramos pelo olhar. Assim, descaradamente, na frente de todo mundo. Aquele absurdo matinal. Um desejo de boca que aproximava, e que encarava. Assim, na frente de todo mundo.

Sabe daqueles olhares que dizem de si mesmo, como que falam "Sim, sou eu eu mesmo, eu estou te olhando mesmo. É isso, paquerando com você". E de tão metaolhar, era irônico, sarcástico.

Durante nosso namoro, nos vimos, nos escondemos. Rimos um da cara do outro, um na cara do outro, tamanha cara de pau. Em alguns momentos era brincadeira, em outras, sedução. [Ora, e quem disse que sedução não é um tipo de brincadeira?]

Aproximei-me. O olhar ficou mais curto. Era preciso mais volta do pescoço. Difícil. Ali, na frente de todo mundo.

Saí sem saber seu nome. Namoro de sem nome, namoro de olhar. Mas me despedi, mesmo assim. Nosso namoro acabou sem que nos olhássemos novamente. Ali, na frente de todo mundo.

domingo, 3 de agosto de 2014

nem sei mais se desejam

e eis que me aparecem uns gestos, e eis que ensaio e enceno uns gestos do nada.
do nada, me roço nas paredes, nos cantos e nas esquinas.
aproximo minha boca das portas, das paredes. me torno lascivo.
sou lascívia pura, e me pego acariciando o mundo inteiro, as mesas, as portas, o computador.
beijo meus óculos, e fico me cheirando, um cheiro aqui, outro acolá.
sinto falta de pele, de pelo, e nessa falta me vêm tais gestos, que visam se completar e completar o mundo.

não, eu não caibo mais em mim, e, suponho, que nem mais em ti. eu inflo pro mundo, me perco sem retornar. daí que olho para a varanda, meio desalento. rosto pro lado, cabeça na mão, cotovelo na mesa.
perdi até minha escrita. nem sei mais como escrever.

p.s.: daí que meu cheiro e teu cheiro se misturaram, não se dissipam nem se desmembram mais:
se desejam.


purafectude

e tu, que é pura afecção,
e teu corpo, que não é mais como o corpo dos outros
teus olhos são maiores, tua pele, mais extensa, quase infindável: infinita.
nessa boca que me esqueço, me aprofundo, e que esqueço, por vezes,
esses braços estendidos, do tamanho de um mundo, um mundo de dois a dois

e tu, que é pura afecção
teu corpo é contágio, teu corpo é aberto, não fechado
porque eu abro esse teu corpo, te rasgo, abro inteiro, para ver o que tem dentro
para sentir o que tem dentro
mas não há nada, há só afecção
há só eu e tu

teus olhos não são mais como antigamente
não são mais olhos fechados em si, nas suas órbitas,
eles se abrem quando eu chego, se abrem para mim, e se derramam em minhas mãos
se derramam em beijos

não são mais olhos dentro de um corpo que meu olho acessa de longe, na sua completude
não há mais completude, há só incompletude
há um vazio, como aqueles joguinhos em que falta uma peça
em vão, os blocos, os dígitos vão se movimentando na tentativa de completude, mas nunca se chega a tal, mas é aí que ocorre o movimento, o fluxo, o fluido: o jogo e a brincadeira permanecem latentes, e nunca findam

espero que a gente não finde
a gente, que é pura afecção.

"esse pequeno poema pra ti"

sinto teu cheiro no meu braço,
e me revelo todo.

performando um conceito

vou criar, eu mesmo, um conceito de performance
de performance como brincadeira
como para tirar o tédio do dia a dia, para fazer e ocupar o ócio
performance para aquele que não tem nada pra fazer, pros ociosos, deprimidos e oprimidos
vou criar performance, inventar um conceito, ler mil livros e rastejar sobre eles
performance para minar a ansiedade
performance que existe só porque existe ansiedade
performance que existe pra ansiedade, como vício
sem desculpas, ou como desculpa
como confissão ou confusão
do amor chorado, do amor vivido, do amor estraçalh

terça-feira, 22 de julho de 2014

falemos dele nela

daí que olho no corpo meu corpo
vejo os hematomas, mas nem lembro das dores
parece mesmo que essas dores são para dizer que o corpo está aqui, que ele existe, que ele resiste e que ele re-existe. re-existir é existir a cada um, a cada momento, a cada dor. ficam os hematomas. as dores passam, por hora voltam, e o corpo permanece: re-existe.

daí que olho no corpo os hematomas. talvez os ache bonito. o corpo reclamou. é preciso mais cuidado. é preciso mais carinho. mas não pára. ou pára, ou pára tudo.

desrespeito os novos acordos de ortografia da língua que diz portuguesa. pára, como acento mesmo mesmo: continuo com o acento. falo brasileiro tropical(ia). falemos doutras línguas. 

sábado, 21 de junho de 2014

espero ver-te

na onda do teu cabelo, eu me perdi
e tu me fizestes me perder também
nos bicos dos teus peitos, ao abrir tua camisa, e desvendar teu saco
te vi nu, me visses nu, e nus nos abraçamos, nos demos

me perdi nas palavras que dissesses
e no "eu quero te ver de novo" eu acreditei
talvez possa acreditar de novo, não sei [mais]
quero-te por perto, bem perto, muito parte
carne e carne, unha e unha, cheiro no cangote

nesse meio pouco da gente, de nós
do pouco e do muito que temos a oferecer mutuamente

não tem medo; não te arrecifes: eu cuido da tua dor, e tu cuidas da minha
pra sarar juntos, delicados, e amados

espero te ver.

quarta-feira, 11 de junho de 2014

[poderia ser.]

tomava banho
um gota passou por meio do canto do olho
achei que fosse uma lágrima

[poderia ser.]

domingo, 1 de junho de 2014

não sê-lo, eis a questão

[lembrando de Rodrigo Vaz]

nesse dia, eu senti empatia por quem é considerado "louco"
pelos olhos, pela reclusão, por aquela porta-vala que se abria e para onde iam, eu pensei que iria também,
que poderia ir

e, no meio dessas poucas falas e explicações, de pouca instrução, de sacolas de industrializados, eu me senti pertencente a esse espaço e temeroso por isso, ao mesmo tempo em que os via tão ignorantes de si mesmos, suscetíveis ao apelo, à interpelação do outro: "ele é louco, minha senhora".

e louco tenho me sentido, e tenho mais medo, mesmo, é da normalidade. ser normal é linha tênue, é pânico, é medo de não ser normal. tenho empatia pelos loucos porque, quem sabe, devo ter empatia por mim e pelos outros.

não ser normal.
talvez nunca tive tanta ideia do que isso, meu querido, queria dizer.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

do verbo lindar

patenteei o verbo lindar.
agora é assim:

eu lindo e tu lindas.
ele e ela linda. nós lindamos, e vós: lindais.
eles lindam.

eu lindo e tu linda, nós lindamos.
eu lindo, tu lindo e tu vindo.
tu lindo, eu vindo e eu indo.

vem me lindar
lindo eu, lindo tu
acabei de lindar tu
vem me lindar também
eu te lindo: tô te lindando

tu já me lindaste
e, lindado, permaneço aqui

um'bora lindar
pra lindar o mundo
lindar a gente
vamos lindar

lindar vem do latim lindare, que, segundo o Houaiss de 2007, significa "deixar puro, empurecer, do puro" e, em outro campo semântico "permanecer, ficar, deixar estar". no século XVI, referiu-se grosso modo, na releitura romântica de epopeias gregas, ao predicativo da personagem principal feminina que só se deixava ficar por causa de sua pureza e da pureza de seus sentimentos. a ideia sujeira era, então, aplicada à ideia de passageiro, de nomadismo e também de invisível e de reversível. desde então, o verbo entrou em desuso. talvez graças ao aplicado recurso de desvinculação, na literatura, após a onda romântica, das noções de pureza e de permanência, ou ainda, quando a noção de pureza vai perdendo a potência com a decadência do discurso cristão, e sendo sendo reapropriada por outros discursos, como os foucaultianos e rabelaisianos (ver Foulcault, M. e Rabelais apud Bakhtin, M.). 

segunda-feira, 31 de março de 2014

suspiros de chuva

Daí que do outro lado, a uma rua de distância, ele se ancorou na varanda de casa e olhou. Olhou pro céu, olhou pra rua, olhou também pro lado de cá. Não sei bem se olhou para cá, mas, de algum modo, senti seu olhar invadir a minha casa, adentrar os muros do condomínio, se espreitar pela abertura da minha varanda e chegar à minha sala. E emplacar, também, nos meus olhos.

E ele se deu assim. Jogou o corpo quase para fora de casa: os olhos voltados para a rua, o rosto quase do lado de fora, assim como suas mãos. É uma varanda ampla, que sai quase toda para a rua. Aqui é assim, as casas pequenas ampliam-se, tornam-se duplex, triplex, ganham varandas amplas ou se tornam mesmo grandes caixas fechadas. Ou permanecem, como o passar dos anos, do mesmo jeito como foram construídas.

Por um momento, pensei se fôssemos amantes, e o quanto me angustiaria olhá-lo assim, de longe, sem poder tocando, tocando-o só com os olhos. Ele casado, na casa dos pais, com filho, e meu amante, de vir em casa, mas me olhando, agora, de longe. Suspiraria, fingiria que não olhara para olhar de novo e vê-lo e amá-lo de longe. Ele estaria se dando a mim de sua casa, a uma rua de distância. E eu aqui.



Mas esses sonhos narrativos se desfizeram logo quando ele entrou em casa, adentrou o escuro da porta da cozinha (a varanda é também os fundos da casa em cima). Percebi que era só imaginação, que ele não era quem eu pensava. Mesmo assim, suspirei.

sexta-feira, 14 de março de 2014

bises bises à bientôt

Je préfère maintenaint t'ecrire avant qu'il soit trop tard. Je voudrais te dire autant des choses, mais surtout que J'ai appris à parler ta langue. Donc je peux me communiquer, me corrépondre avec toi, parler de mes chansons, de mes amours, parler de gens que je rencontre partout.

Tu me manques. C'est lá où je me pers. Je t'aime.

À bientôt, bises,
Merson.

domingo, 9 de março de 2014

de que e de quem sou vítima

daí que entrei no teu quarto, me enfurnei nos teus livros, me desloquei até tua cama
nem te vi direito naquele escuro, mas podia escutar muito bem
essa pele, esse cuzinho, tudo tão gostoso

agora eu espero um sim
um vamos sair
entre uma punheta e outra, um sonho e outro

da tua pele morena, tenho saudades
porque ela me lembra doutras peles morenas,

e daí meus sonhos, de que sou vítima, que me atacam

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

maniumfesto

será necessário falar apenas dos afetos, das sensações, dos desejos experimentados, vividos?
será possível apenas um "falar de si" por aqui?
ou há espaço para a criação literária de ficção?

poesia ou literatura?

escrever como um gesto sem fim, cotidiano, talvez sem futuro, mas com materialidade. de gestos, de canções, dos afetos, do fazer ficção.

[e quando escrevo poesia, não faço ficção?]

penso num novo momento aqui no blogue. de uma escrita que se flua [ainda] mais para outros fazeres: outras escritas, outros estilos, doutras formas. doutros temas, doutras referências ou referenciais. não é algo que se decide de uma hora pra outra, mas, que, talvez, se construa com o tempo. esse tempo da fabulação que não é de um segundo, nem de um minuto: talvez, de uma vida toda.

i will sobreviver, hey hey

porque escrever é passar o tempo. é ocupar o tempo de alguma forma. é ocupar o tempo do jeito que eu sei fazer melhor. fazer melhor porque mais espontâneo, porque mais livre, porque mais leve.
porque escrever é também companhia. é des-companhia. da janela do meu quarto eu posso ver alguém escutando I'll Survive. Escuto daqui e acompanho. Estou sozinho, mas eu pretendo e vou sobreviver.

porque escrever é também estar no mundo, é se inscrever de alguma forma no mundo, é passar o tempo, é se inscrever no tempo.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

17/09

essa cidade ainda me é cheia de lembranças, coisas de que não consigo esquecer. o corpo marcado, a memória em chamas. chamam para si, para essa superfície epitelial, mas também àquela superfície rugosa do cérebro inúmeras imagens sem fim, sem nexo, talvez com apenas um destino: esquecê-las.

do tecido afetivo da cidade ou o direito às memórias.

o que te trago de fortaleza? as músicas que agora me tomam...

fazendo a sophie calle.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

sozinho

estar sozinho pode ser bem difícil.
pode ser fácil.
pode-se escrever bem sozinho. pode sair uma cagada.
pode-se precisar de inspiração. pode-se tentar pra esquecer.

porque assim: eu escrevo, e assim esqueço, e me animo, e escrevo mais.
é assim que quero, que gosto de ser.

tenho saudades.
saudades: me deixa em paz.

sábado, 11 de janeiro de 2014

pernidez

tuas pernas pesando
por sobre cima das minhas pernas
por sobre cima das pernas do nosso colchão

sábado, 4 de janeiro de 2014

secgredus

eu entro no banheiro
e escondo meus segredos.