segunda-feira, 7 de março de 2011

Leveza suicida

- Sabe, nesses dias tenho pensado sobre suicídio. Tip, eu achava que quem usava as forças vitais justamente para se anularem a si mesmas só fazia porque não conseguia suportar, nos ombros, o peso de responsabilidades do trabalho, os problemas pessoais, de família ou de dinheiro. Mas aí hoje soube de um cara que simplesmente não queria viver. Tinha desistido de tudo, nada mais o satisfazia, e o pensamento de morrer era tão natural quanto respirar. Ele não ia se matar, mas estava meio anoréxico, daí que um amigo médico havia dito que ele podia morrer a qualquer momento nessa semana. Descobri que ele queria - ou era indiferente à própria morte, porque - pausou, enquanto segurou o cigarro na boca e o acendeu - o que lhe pesava era a insustentável leveza do ser...

- Rapaz...mas como é que tu percebeu isso?

- Cara, meio óbvio, sabe. Ele tinha de tudo: podia viajar a hora que fosse, sair sem se preocupar em quanto gastar, ter os amigos que quisesse, curtir a vida adoidada, algo que é meio diferente da gente. E nada mais satisfazia, ou ele vivia meio virtualmente, entre ar-condicionados, redes sociais e tv a cabo, sei lá...A morte é apenas uma constante, uma condicionante no meio desse mundo meio virtual, onde nada mais parece tanger o real. Foi perturbador perceber que não havia mais o que ele fazer. Havia recusado médicos, psicólogos e mesmo os amigos. Sua vida, sem necessidades e repleta de escolhas, era leve demais para ser suportada.

- Porra, véi, num acredito muito nisso, sério mesmo. Acho que tem alguma coisa aí, uma doença, um grande problema, depressão, alguma coisa, mas não apenas isso.

- Demorou a me cair a ficha também, mas caiu. A vida dele era surreal pra gente, de fora, sabe. Tudo parece uma casta, uma bolha, e sempre se pensa pra frente, pra cima, num sei. Sempre as coisas leves demais, grandes demais, no alto de um prédio, na panorâmica de uma cobertura. Não há chão, não há teto também, há uma grande vista, não há pés no chão, literalmente. E era a falta desse peso, dessa necessidade de lutar, de viver, de conquistar, que deixava ele leve o suficiente para que as coisas também perdessem todo o seu peso, e também todo o sentido. Acontece que a vida também ficava leve. E a vida, de tão leve, de tão parecer um sonho, passava a ser virtual, insignificante, indiferente. Espero que ele não morra...- suspirou, dando a tragada final.

2 comentários:

  1. Não sei se é curioso - talvez seja mais humano do que se possa imaginar - mas ultimamente a minha vida também tem se passado assim, suspensa, em brancas (ou cinzas) nuvens. A vontade que se instala é de simplesmente deixar o barco correr ou, mesmo, afundar. Mas sei que, no fundo, mesmo estando pouco visível, existe - e sempre existirá - uma vontade danada de continuar acreditando na vida, ainda que por enquanto o medo ainda seja maior do que a vontade de me jogar nessa grande aventura. Prefiro continuar acreditando que ele vai largar do meu pé e que o desejo ainda vai me vencer pelo cansaço.

    Saiba-se lido e compreendido. Torço daqui pra que com você aconteça o mesmo. Fique bem.

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  2. P.S.: http://www.youtube.com/watch?v=bEVOR6djl84

    Linda, cai muito bem.

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