Os relacionamentos precisam de marcas do cotidiano para se estabelecerem. Nenhum relacionamento dura mais de três meses somente por paixão ou por encantamento. Ou menos que isso. O cotidiano vem à tona, diz que está ali. Ambos se conhecem como vivem, a partir de então, e a idealização vai sendo lapidada pelo dia-a-dia.
Mais tarde, o relacionamento se habitua ao cotidiano. Se, no começo, era ele quem começava a desiludir qualquer sinal do ideal, é em cima dele que o relacionamento passa a se construir. Algo meio materialista. Materialismo histórico (?).
Percebi isso hoje, quando telefonei ao meu namorado, e falamos de coisas cotidianas.
Tá fazendo o quê?
Tow no trabalho
Vai fazer o que hoje?
Ficar em casa, estudando
Vai sair, não?
Não.
Tua aula começa a que horas?
Lá pras três e meia, quatro horas.
hum
hum
...
Praticamente, sabíamos as repostas para qualquer uma dessas perguntas. Sinceramente, sabíamos sim. Mas saber como será o dia do outro, ou se o cotidiano continua como habitualmente, ou se haverá uma pequena ou grande mudança hoje, é sinal de atenção ou preocupação - mesmo que tudo isso seja bastante previsível. Mas é mais que isso. Perguntar sobre hoje, ou amanhã, ou sobre a continuidade de qualquer ação habitual periódica é desvendar as marcas do cotidiano, trazê-las para a linguagem, e dizer, implicitamente: "Amor, eu estou no seu cotidiano; e você também já está no meu. Isso é o nosso relacionamento, babe!" Qualquer modificação desse cotidiano é algo alheio ou estranho ao relacionamento, que pode ser algo bom ou ruim. No mais das vezes, a quebra de um cotidianho conjunto, ou dentro um qual um está inserido no do outro, é o fim de um namoro.